Artigo de João Durana

A Eficiência Energética e a produção descentralizada nas cidades

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Publicado a 14 de fevereiro de 2023

A cidade vista como um produto de consumo

Existe, hoje em dia, uma maior consciência para com a sustentabilidade das nossas escolhas, seja no que comemos, no que vestimos ou no que usamos no dia a dia. Envergamos orgulhosamente roupas ou comemos alimentos com a certificação de sustentabilidade, nem que para isso tenhamos que pagar mais um pouco, ou até bastante mais.

Se antigamente as pessoas imigravam para os grandes centros urbanos por necessidade, à procura de melhores oportunidades de emprego, hoje não é essa a realidade. Olhamos mais para critérios como a segurança, a qualidade de vida e, cada vez mais, a sustentabilidade.

A digitalização de processos tornou possível o trabalho remoto, e o surgimento dos “nómadas digitais” é prova disso mesmo. Assim, têm as cidades de se adaptar a este novo paradigma.

As cidades dos países mais desenvolvidos sofrem, hoje em dia, de um “problema” cuja causa está nesse mesmo desenvolvimento – o envelhecimento da população. A taxa de renovação da população é baixa e começa já a provocar problemas, não só nos sistemas de segurança social, como ao nível da oferta de mão de obra.

Como podem, então, as cidades competir entre elas na atração de população de forma a garantirem a sua renovação?

As cidades que queiram prosperar têm, hoje, que se colocar num lugar de destaque perante as outras. Existe uma larga franja da população que é móvel ou “nómada” e que pode trabalhar a partir de qualquer ponto do planeta. É na atracão e fixação dessa população que estará o segredo. E, para isso, é importante que as cidades se destaquem de uma forma que seja apreciada por essa geração mais novas e mais exigente.

Tal como com as roupas ou com a alimentação, essa população dá muita importância à sustentabilidade no momento de fazer a sua escolha relativamente ao local onde viver. Poder dizer que se vive numa cidade sustentável, vai ser igualmente motivo de distinção e orgulho.

E como pode uma cidade, por mais antiga que seja, adaptar-se de forma a ser mais sustentável?

As soluções tecnológicas existem, já, há vários anos, mas a implementação tem sido lenta. Para haver mudança tem de haver rutura, pois caso contrário a mudança será lenta. Veja-se, por exemplo, há quantos anos se fala das alterações climáticas! Como é um processo lento, a mudança para hábitos mais sustentáveis tem sido lenta. No entanto, ainda há poucos meses passamos por uma pandemia e, em menos de um ano, conseguimos desenvolver três vacinas! A humanidade quando é posta à prova costuma responder à altura.

Artigo de João Durana

Estamos, infelizmente, a passar por uma guerra na Europa. Essa guerra veio pôr a nu a elevada dependência energética que a Europa tem perante um determinado país e principalmente do gás natural. Seja qual for o desfecho desta guerra, uma coisa é certa, o salto rumo à independência energética e o aumento da utilização de fontes renováveis de energia é já uma garantia.

É neste contexto que podem e devem as cidades olhar de uma forma holística e integrada para as soluções de redução de consumos e produção de energia sustentáveis. A tecnologia existente permite hoje uma maior democratização da produção energética. Conseguimos produzir energia praticamente em qualquer local do planeta, já não estamos dependentes do país X ou Y. O sol, o vento ou a água, existem em conjunto ou isoladamente em quase todo o lado e em quantidades suficientes para que se consiga suprir grande parte das nossas necessidades enérgicas. Energias produzidas localmente sem necessidade de grandes custos de transporte e em maior segurança.

O primeiro passo para a sustentabilidade é reduzir o consumo, fazer mais com menos: menos água, menos energia, menos recursos. O segundo passo é suprir essas necessidades recorrendo a fontes de energia limpas e renováveis, instalando produção fotovoltaica, eólica e/ou hídrica.

Cada cidade é um caso. No entanto, as soluções existem sendo apenas uma questão de decidir quais e como as usar. Para as necessidades domésticas, a produção mista de energia fotovoltaica e eólica com armazenamento, permite suprir as necessidades energéticas durante o dia, quando há sol e vento, e durante a noite, quando há vento. Existe, ainda, a possibilidade da criação de comunidades de energia. Ou seja, num determinado espaço, municipal ou privado, podemos instalar painéis solares e/ou turbinas eólicas para a produção e distribuição de energia, como por exemplo num parque industrial, um bairro ou edifícios de serviços.

Painéis solares

Existem milhares de metros quadrados de superfície que podem ser aproveitadas para a produção de energia solar, sejam telhados, coberturas de parques de estacionamento ou coberturas de unidades fabris. A energia eólica tem, já, soluções de menor porte para instalação de uso doméstico e para pequenos edifícios de serviços. A mobilidade elétrica pode e deve ser sustentada através do uso de energias renováveis. Cada posto de carregamento, pode produzir, localmente ou através de uma comunidade, a energia necessária para a sua operação.

O uso racional da água, com a instalação de dispositivos de monitorização e controlo, aliado à recolha e armazenamento de águas pluviais, surge como uma oportunidade de melhoria económica substancial nas cidades. Aproveitar a circulação da água para produção de energia através da instalação massiva de mini turbinas nas condutas da cidade, ou até a criação de depósitos comunitários para a recolha das águas pluviais, em conjunto com mini-hídricas para produção de energia.

Esta visão holística da cidade permite que a soma do todo seja maior que a soma das partes. Através da utilização de soluções mistas e integradas, uma cidade pode, assim, alcançar a sua independência energética. E independência energética significa menos custos, mais segurança e sustentabilidade.

Eu gostaria de viver e trabalhar numa cidade assim.

João Durana - Responsável do Departamento de Serviços de Eficiência Energética da PreZero Portugal
João Durana

Responsável do Departamento de Serviços de Eficiência Energética

Engenheiro Eletrotécnico licenciado pelo Instituto Superior de Engenharia do Porto, integrou a Ferrovial Serviços em 2008, como Representante de contratos de gestão e manutenção. Atualmente é Responsável do Departamento de Serviços de Eficiência Energética da PreZero Portugal.